sábado, 5 de junho de 2010

Fogo Insano

Cibele morava em um cortiço. As casas eram coladas umas nas outras e bastante pequenas. Cibele morava no numero 14. Quase todos os vizinhos se davam bem e eram comunicativos uns com os outros. O único que fugia à regra era o homem no número 13, vizinho de Cibele. Este já morava no cortiço à um ano, mas os moradores não sabiam sequer o seu nome. Era um homem sinistro e tenebroso.
Certo sábado à noite, Cibele estava preparando seu jantar, quando a mangueira do gás estourou, fazendo de seu apartamento uma bomba relógio. “Meu Deus! Vai explodir!”, pensou Cibele. Desesperada e sem saber o que fazer, foi até os vizinhos da frente pedir ajuda. Não encontrou ninguém. De fato, o cortiço inteiro estava deserto. A única luz acesa era a do homem do número 13.
No desespero, a estranheza do vizinho nem foi considerada. Cibele correu até sua porta e bateu freneticamente. O homem abriu a porta, e não se deixando abalar pelo estado em que a mulher se encontrava perguntou:
- O que você quer?
- Meu gás está vazando, eu não sei o que fazer, por favor, me ajude!
- Tem certeza de que quer minha ajuda? – Perguntou o homem.
- Como assim? Por favor, rápido!
- Está bem. - disse o homem, dirigindo-se calmamente até o apartamento de Cibele.
Não havia botijão, o gás encanado era provido pelo dono do condomínio. O morador do apartamento número 13 olhou em baixo da pia, e fechou a válvula de segurança, que existia exatamente para casos como este.
- Pronto - disse o homem.
- Meu Deus, muito obrigada! Devo muito ao Senhor! – agradeceu Cibele.
- Sei disso, mas é por pouco tempo – respondeu o homem enquanto se virava e trancava a porta do apartamento.
- Precisaremos de camisinhas, velas, manteiga e um cabo de vassoura – disse com um brilho mórbido no olhar, homem do apartamento 13, enquanto desabotoava suas calças.

sábado, 22 de maio de 2010

SEM EIRA NEM BEIRA

Às 6 da manhã o galo canta e Tião acorda para mais um dia de trabalho no campo. Abre a janela do seu quarto e deixa os tímidos raios de sol ocupar o mesmo. Vai à cozinha e - como de costume - põe a água no bule enquanto sua mulher prepara a mesa. Tião senta-se e saboreia um delicioso café da manhã. Pega sua trouxa, sua enxada e vai para o campo.
“Que dia lindo” pensa Tião, na beira do rio, a caminho de sua plantação. Nela chegando, começa a arar o solo, ao mesmo tempo em que observa as calmas águas do rio, “é um espelho reluzente” pensa ele. Mais tarde, chega seu filho com uma refrescante limonada. O pai afaga a cabeça do garoto e da uma enorme golada no suado copo.
O momento entre pai e filho é interrompido por dois homens vestidos socialmente. “Quem serão esses?” pensam Tião e seu filho. A esposa de Tião observa de longe os dois homens abordarem seu marido e filho, “Será coisa séria?” pensa ela. Os dois se vão antes que ela chegue até o local. A face desolada de Tião faz com que sua mulher se desespere internamente, quase a impedindo de perguntar o que se passara.
Na manhã seguinte, Tião acorda, abre a janela e observa o céu nublado e o rio turvo. Mais tarde, com sua mulher e filho, chega à beira do rio com dez dos cem passos antes necessários. Entrega-os aos dois homens vestidos socialmente. Observa-os partir no barco. Na medida em que as águas do rio tomam o pequeno espaço de terra em que Tião se encontra, os dois homens retornam com o barco. Tião embarca. Deixa para trás sua casa e quase todos os seus pertences. De longe, durante o trajeto pelo rio, Tião avista as enormes comportas, que cospem água freneticamente. O pensamento de Tião remete a todos os momentos felizes que vivera com sua família no local agora submerso. “Perdi tudo o que eu tinha. Perdi tudo o que eu era”, pensa Tião, antes de se jogar nas águas do rio Paraná para nunca mais ser visto novamente.

O PASSARINHO NÃO TRABALHA

Empregada no Banco do Brasil, Béia – apelido dado pelos colegas de trabalho – era o ápice do funcionário exemplar. Entregava todos os relatórios antes do tempo, era exímia no atendimento dos clientes e era candidata preferida ao cargo de gerente da agência.
“Não devo ter as expectativas altas, pode ser que não aconteça”, era o pensamento constante de Béia, que perdia o sono pensando na promoção. Não dava atenção ao marido e menosprezava as necessidades dos filhos, tinha a mente completamente voltada ao trabalho.
Esta falta de atenção à família, na verdade, já acontecia há muito tempo, mesmo antes da possibilidade de promoção. Béia sempre se focou apenas no serviço, sob pretexto de que assim alcançaria uma condição melhor, e com isso, poderia passar mais tempo com sua família, mas a verdade é que o desejo de ser reconhecida era antigo, ser bem sucedida sempre foi o maior gol de sua vida.
Enfim, numa manhã enquanto atravessava a rua que dava ao banco onde trabalhava, Béia avistou, dentro deste, uma enorme faixa vermelha, linda, reluzente, com lantejoulas que diziam “PARABÉNS, BÉIA, NOSSA NOVA GERENTE”. O susto e felicidade foram tão grandes, que Béia estacou, no meio da rua. Os pensamentos “Meu Deus! Que felicidade! Até que enfim fui reconhecida pelo meu esforço! Finalmente terei liberdade no trabalho! Finalmente terei tempo para minha família!”, foram os últimos que teve, antes de ser atingida em cheio por um caminhão de bombeiros, lindo, novo, reluzente. Morreu ali, em pedaços, Béia, cuja família não chorou no velório nem tão pouco sentiu falta.

domingo, 16 de maio de 2010

Helena de troça

Helena está na fila de um banco, quando, de repente, um indivíduo, atrás da fila, se sente mal. Devido à experiência com seu marido cardíaco, tem a impressão de que o homem está tendo um enfarto. Em sua bolsa há uma cartela de medicamento, que poderia evitar o perigo de acontecer o pior.
Helena pensa: “Não sou médica – devo ou não devo medicar o doente? Caso não seja problema cardíaco – o que acho difícil -, ele poderia piorar? Piorando, alguém poderá dizer que foi por minha causa – uma curiosa que tem a pretensão de agir como médica. Dou ou não dou o remédio? O que fazer?”.
A tensão e a dúvida rasgam Helena ao meio, os poucos segundos que ela dispõe para tomar uma decisão parecem estender-se a horas. “O que eu faço? O que eu faço?”, ela repete freneticamente em pensamentos, tentando achar, desesperadamente, resquícios de lembranças sobre ocasiões semelhantes para que nelas pudesse apoiar sua decisão.
A iluminação não vem. Helena observa agora desesperada, o homem ajoelhar-se e apoiar uma mão no chão e outra no peito, desfalecente, em abomináveis grunhidos de dor. “Meu Deus! Vai morrer”, pensa Helena, que mais por instinto do que por decisão tomada, corre até o homem. Sem pensar, e de supetão, tira comprimidos de sua bolsa e lança-os na garganta do indivíduo, ao mesmo tempo em que um médico se manifesta, gritando para que todos saiam da frente, alegando que o homem está tendo um ataque cardíaco. “Ufa! Que alívio!”, pensa Helena ao ouvir tal alegação, “Não sei o que faria se tivesse feito algo que não devia”. Ela informa ao médico que acaba de dar comprimidos cardíacos para o homem. O médico a parabeniza pelo feito heróico, tirando-lhe das mãos a cartela de comprimidos para checar a dosagem.
“Salvei a vida deste homem. Ele teria morrido aqui e agora, não fosse por mim”, ares de salvadora tomam Helena que jamais sentira tanto orgulho de si mesma. Seu momento sublime, no entanto, é interrompido por um agudo grito de dor vindo do homem no chão e um sonoro “Meu Deus” vindo do médico, que se lança sobre esse, iniciando técnicas de ressusitação. "Meu Deus, que foi que eu fiz?" pensa Helena, ao ver, caída aos pés do médico, a cartela de viagras que trazia na bolsa, junto aos medicamentos cardíacos de seu marido.

domingo, 25 de abril de 2010

Tudo muito gay

Aqui embaixo estão trabalhos que foram feitos na aula de produção de textos, é tudo muito gay, dois descritivos e uma narração, a parte boa dessa aula é que acabo tendo material para colocar aqui. Não foi feita nenhuma revisão e os textos estão fudidos na sintaxe e pontuação mas vá lá...

A rosa sem pétalas

Encontrei Maria Alice que bebia sozinha no botequim na noite de natal. Senti-me compelido a lhe fazer companhia. Cruzei a rua deserta e aproximei-me do depressivo boteco, que ostentava uma iluminação fraca, amarelada, morta. Maria Alice continuava segurando o mesmo copo de cerveja desde quando a avistei, seu olhar estava longe, como que vislumbrando um sonho. Estava linda, muito bem vestida, pesados brincos prateados pendiam-lhe nas orelhas, um forte rastro de lápis negro riscava-lhe as margens dos olhos.
Fui notado pouco antes de me aproximar de sua mesa, seus olhos fitaram os meus, estaticamente, “oi” ela me disse, respondi com a mesma interjeição, ato contínuo, sentei-me e lhe perguntei o que fazia ali. “Você soube?” ela disse, respondi que sim, e disse que sentia muito. Ela então relatou que estava em casa, e movida pelo espírito do dia, arrumou-se quase que instintivamente. Pensou que se fizesse isso, algo apareceria para tirá-la do poço de depressão em que se encontrava. Perguntei-lhe onde estavam suas amigas, e ela respondeu que todas viajaram para festejar na casa de parentes. Perguntei-lhe então por que ela também não viajou à casa de algum parente. Ela disse que nunca se deu bem com seus tios e tias, e que mesmo as circunstâncias não mudariam isso.
Os papéis se inverteram e agora era ela quem me perguntava o que eu fazia andando por aí nessa noite. Disse-lhe que gostava de andar a essa hora, e que além do mais, minha família não comemora o natal, mas aproveitavam o feriado para visitar parentes, e eu, como detesto visitar parentes, sempre era deixado sozinho em casa nesse dia. Seu rosto demonstrou espanto por não saber desse detalhe sobre minha vida, mesmo me conhecendo a tanto tempo. Ela então questionou se eu não teria parentes na cidade que comemorassem a data, respondi que sim, mas que eu realmente não dava a mínima. Fui atingido por um leve olhar de censura, que se perdeu no que parecia ser gratidão por eu estar lhe fazendo companhia.
Ela fez um comentário sobre eu desperdiçar minha opção de passar o natal com familiares, enquanto que ela daria tudo por tal programa, mas tudo que lhe restara fora uma casa vazia. Nesse momento, após uma longa golada no copo de cerveja, seus olhos ficaram vermelhos, e uma grossa lágrima escorreu pelo canto esquerdo do rosto. Disse-lhe novamente que sentia muito. Fui preenchido por um forte sentimento de pena, que misturado com seu lindo rosto, fizeram-me convida-la a minha casa, mesmo correndo o risco de ser mal-interpretado. Disse-lhe que poderíamos ver um filme, ou comer alguma coisa. Ela enxugou as lágrimas do rosto, e ostentou um leve sorriso, dizendo que ficaria feliz em me acompanhar.
Iniciamos nossa caminhada até minha casa. Na faixa de pedestres, enquanto aguardávamos que a torrente de carros cessasse, Maria Alice pegou em minha mão, e me lançou um largo sorriso, em sincera felicidade, aparentando ter esquecido ao menos por um momento o terrível acidente que levara seus pais e irmãos.

Seu Joaquim

O ar do quarto era espantosamente leve, sereno, contrariando qualquer expectativa macabra do cenário. Assemelhava-se a um santuário, meticulosamente bem arrumado, como se houvesse sido previsto que, ao despejar da manhã, diferentes vultos por ele transitariam. Muitos, estranhos, maculando-o por mera curiosidade.
Ao centro do quarto, a fúnebre cama suportava todo o peso de seu descanso final. Jazia de atravessado, com as pernas para fora do ataúde que a cama se tornara, como se seu último ato no universo tivera sido em um frustrado esforço inumano para erguer-se e encarar o fim de pé.
A sombra da morte não lhe roubara o semblante apaziguador, que em vida, se fez muito útil em situações exatamente iguais a esta. Trazia o véu da face esticado, livre das usuais rugas, como se tivesse sido polido com destreza ao decorrer de sua ultima noite.
Tocava o chão com as pontas dos pés, como que simbolizando uma pequena conectividade com o que ficara para trás. A chama do sol atravessava a janela, fulminando-o ao centro do peito, projetando no mesmo um luminoso triângulo, alheio ao fato de que seu calor e ternura já não poderiam mais ali ser sentidos.